Como a China manipula o mercado com carros 0km usados –

Você compraria um carro “usado” que nunca foi rodado? Pode parecer estranho, mas é isso que está rolando na China. As montadoras estão registrando carros como vendidos, colocando placas e, logo em seguida, exportando eles como se fossem usados, mesmo sem ter rodado um quilômetro.
Essa prática inusitada tem como objetivo aumentar as vendas da indústria automobilística da China, que é a maior do mundo. Os governos locais também apoiam, vendo isso como uma forma de atingir metas econômicas e aumentar o PIB da região.
Embora essa estratégia não seja nova, ganhou destaque com as críticas internas. O assunto virou um debate internacional, levantando preocupações sobre como esses dados são manipulados, a concorrência desleal e até o dumping de veículos subsidiados em outros países.
Como funciona o truque do “usado zero quilômetro”
A manobra é simples. Após sair da linha de produção, o carro é comprado por um exportador, recebe uma placa, é registrado e imediatamente classificado como usado para exportação. Assim, a montadora conta com ele como venda, mesmo sem ter sido usado.
Na prática, o carro nunca foi dirigido por ninguém, mas nos documentos é tratado como usado. Esses veículos estão sendo enviados para países da Ásia Central, Oriente Médio e Rússia, onde é difícil importar carros novos da China.
Os governos locais facilitam o processo. Eles emitem licenças, dão incentivos financeiros e até organizam eventos para promover essas exportações. O objetivo é mostrar crescimento econômico e justificar investimentos na região.
Esse ciclo gera um problema sério: ao inflar as vendas, as montadoras criam uma ilusão de crescimento, enquanto oferecem carros com preços bem mais baixos no mercado global.
Por que o governo chinês apoia essa estratégia
Na China, os resultados econômicos nas regiões são importantes para a política local. Se uma região mostra aumento nas exportações e crescimento do PIB, seus líderes ganham prestígio com o governo central.
Nesse cenário, a exportação de carros zero km como usados se torna uma estratégia. A venda aparece como transação, duplicando o volume de comércio e inflando os números locais. Desde 2019, com a liberação da exportação de usados, milhares de carros foram registrados dessa forma. Para 2024, estima-se que 90% dos 436 mil carros usados exportados não tenham rodado.
Essa distorção também é alimentada pela competição entre montadoras que produzem mais do que conseguem vender. Exportar esses veículos como usados é uma maneira de reduzir o excesso, sem baixar preços no mercado local.
Reação internacional e possíveis consequências
Enquanto a China vê benefícios nessa estratégia, outros países começam a se incomodar. A Rússia, por exemplo, proibiu a entrada de carros “usados” de marcas como Chery e Geely, que já têm representação Oficial.
Outros lugares, como a Jordânia, estão mudando suas leis para fechar essa brecha. Algumas nações agora exigem que um carro tenha uma quilometragem mínima ou algum tempo de uso antes de ser considerado usado.
As preocupações vão além da concorrência desleal. Especialistas afirmam que essa prática pode desestabilizar o mercado automotivo global, prejudicando fabricantes locais e incentivando a compra de veículos subsidiados.
Enquanto os Estados Unidos impõem tarifas altas para conter a expansão das montadoras chinesas, a China busca novos mercados. Porém, essa prática pode se tornar difícil de manter, caso mais países decidam barrar essa “maquiagem” nas estatísticas de exportação.